Me recordo de quando
tinha 16 anos. Me encantei por uma magrela alta do teatro. Me recordo de
desenvolver um sentimento sozinho, é o tal do “amor platônico”, aquele que só
se desenvolve na sua cabeça.
Quando ela passava, eu
prestava atenção, e as vezes abaixava a cabeça para que ela não se desse conta
de que eu estava olhando. Havia ali uma certa de vergonha de admitir que eu
gostava. A real é que todo mundo percebia, meu olhar era revelador, meu sorriso
bobo ao vê-la era maior ainda, e cada vez que eu falava dela meus olhos
brilhavam.
Eu tentava esconder, e
era impossível, não havia como não notar. Eu sentia ciúmes quando um menino se
aproximava dela, ficava sem reação quando ela me notava. Imaginava que cada
movimento dela era pra de alguma forma falar comigo.
Me recordo de passar
uns 2 anos nesse processo, pode parecer bobagem, mas eu era ingênuo, o
sentimento era ingênuo. Existia uma inocência, o sonho de um beijo não
realizado. O sonho de um querer mais que bem querer, que se concretasse em algo
recíproco.
Não havia experiencia,
traumas, nem sequer uma fadiga emocional que me fizesse desistir. Eu passava ao
lado dela esperando ser notado, escrevia poemas que me faziam sentir artista,
imergi em uma melancolia de algo não completado, de uma saudade de algo que não
foi vivido.
Depois de 22 anos é
saboroso notar aquele jovem, te digo de certo modo que tenho orgulho do seu
genuíno sentimento e de sua capacidade de se iludir com o nada. Ele não sabia
ser prático, ele só queria o amor recíproco. Ele não via regras, não analisava
os motivos que o fariam sofrer, ou a forma como as relações se desgastariam com
o tempo.
Esse jovem não previa
um futuro incerto, não pensava quem ou o que tinha a garota, ele só a admirava
e queria estar próximo, ele só queria compartilhar da sua companhia, queria
escutá-la, ouvir seus anseios, a fazer rir, e se possível beija-la e ter seu
coração disparado a 200km.
Não havia maldade, não
havia preocupações sexuais, havia música. Havia a poesia das músicas que
embalavam um possível romance, era a trilha sonora de algo não convertido. Não
existia filhos, ex relações, não havia carga emocional da experiencia. Havia a
simples felicidade de estar vivo só pela presença da outra pessoa.
Me recordo de guardar
seu cheiro, de memorizar seus gostos favoritos. Me lembro de propositalmente lhe
entregar músicas que tinham a ver com ela, mesmo que na minha cabeça tinham a
ver com a gente. E em algum momento ela perceberia, ela notaria que o universo
havia escrito uma sinfonia que ela não tinha prestado atenção.
E ela? Ela não olhava,
não escutava, e não sentia o mesmo cheiro, não memorizava nada, porque na
realidade, seus pensamentos estavam em outro mundo, seguiam em “Nárnia”. Seus
pensamentos voavam do lado inverso ao do romance perfeito. Ela seguia por olhar
o que não servia, insistia em provar o que não lhe fazia feliz, insistia na
busca incessante do desconhecido, enquanto alguém tão perto a poderia fazê-la sorrir
e brilhar como nunca.
Essa era a ideia, esse
era o sentimento que tomava conta da cabeça, essa era a ilusão criada, a viagem
platônica do ser não reconhecido, do sentimento não vivido, da inocência não
compartilhada. Os sorrisos e os olhares que se completavam, talvez fossem obra
daquilo que nunca se pudesse enxergar.
Ali não havia dor, só
havia amor, só havia música, movimentos simples de uma valsa tão bem
orquestrada, onde os passos se uniam de tal forma que só se permitiam
completar, a conexão era insana, seria impossível não notar. E quem poderia?
Captar a simplicidade
da vida exige um olhar ingênuo, entender o que de verdade faz seu coração
vibrar, é o que faz da vida o descobrimento mais delicioso que existe.
Conseguir ter seu olhar refletido no outro, lugar esse onde: olhos, boca e
coração se conectam, é único. E não passa todo dia, e seu enredo é difícil de
parar e seu nó, difícil de desatar. Há uma ansiedade que não cessa, uma paixão
que arde sem se ver, e uma incerteza dentro de uma certeza. Era lindo, simples,
poético e finamente real.
Afinal, é platônico, ou
não é?!
Ale